terça-feira, 19 de julho de 2011

O Fotógrafo

Difícil fotografar o silêncio. entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada a minha aldeia estava morta.
Não se ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas.
Eu estava saindo de uma festa. Eram quase quatro da manhã.
Ia o Silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim no beiral de um sobrado.
Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo.
Fotografei o perdão.
Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa.
Fotografei o sobre. Foi difícil fotografar o sobre.
Por fim eu enxerguei a Nuvem de calça.
Representou para mim que ela andava na aldeia de braços com
Maiakovski - seu criador.
Fotografei a Nuvem de calça e o poeta.
Nenhum outro poeta no mundo faria uma roupa mais
justa para cobrir a sua noiva.
a foto saiu legal.

Manoel de Barros

Um comentário:

andré telles disse...

Parabéns pelo blog Musfil... muito interessante. É isso ae!